Enchentes no RS: como a situação pode afetar produtores rurais e Fiagros?

A situação de calamidade devido às enchentes no Rio Grande do Sul pode afetar significativamente os produtores rurais e os Fiagros.

Enchentes no RS: como a situação pode afetar produtores rurais e Fiagros?
SNFZ11 mira valorização de fazendas - Foto: Pexels.

A situação de calamidade devido às enchentes no Rio Grande do Sul impactou significativamente o cotidiano de produtores rurais no Estado, e consequentemente, pode afetar a rentabilidade de alguns Fiagros (Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais), afirmam os especialistas.

Marcos Piellusch, professor da FIA Business School, afirma que investidores posicionados em Fiagros com exposição ao setor agrícola nas áreas afetadas, podem enfrentar mudanças nos retornos de seus investimentos. “Isso se deve ao aumento do risco de crédito, bem como à potencial redução na produtividade e lucratividade dos projetos financiados”, explica Piellusch. 

Mesmo em áreas menos afetadas diretamente pela água, o acesso restrito devido a estradas danificadas ou inundadas pode interromper as operações normais, como a colheita e o transporte de produtos. Em face dessas dificuldades financeiras, produtores podem buscar renegociações de dívidas, incluindo prorrogação de prazos e alteração nas condições de pagamento de seus financiamentos.

Para Piellusch, neste contexto, o governo deve intervir para ajudar o setor agrícola. Isso inclui medidas como suspensão temporária de dívidas, concessão de novos créditos com condições facilitadas e até apoio direto aos produtores mais afetados. “Facilitar a renegociação de dívidas e oferecer suporte técnico e financeiro pode ajudar a manter a estabilidade econômica do setor agrícola”, acrescenta o professor da FIA.

Recentemente, medidas foram anunciadas pelo governo federal para apoiar a agricultura familiar e os médios produtores rurais afetados pelas intensas chuvas que devastaram diversas cidades do Rio Grande do Sul. 

Entre as ações definidas estão a suspensão do pagamento das parcelas a vencer dos empréstimos de crédito rural, a concessão de descontos nos juros dos empréstimos e a ampliação dos prazos para o início do pagamento da captação de recursos. O montante total de socorro destinado ao setor no estado pode chegar a R$ 5 bilhões.

“É provável que os Fiagros impactados pela crise no Rio Grande do Sul tenham que renegociar seus investimentos, oferecendo prazos adicionais para que o setor produtivo possa se recuperar e retomar suas operações normais. Essa recuperação pode demandar um período significativo, dadas as circunstâncias atuais. Não se espera um cenário de inadimplência em massa e irreversível, mas sim uma reestruturação das dívidas dos afetados”, comenta Marcelo Winter, sócio da área de agronegócios do VBSO Advogados.

Enchentes e seus impactos: investidor deve verificar composição da carteira

Antes de qualquer análise, é crucial estudar o perfil da composição do Fiagros em que o investidor está inserido. Isso é essencial para verificar possíveis riscos. 

Por exemplo, se o fundo tem uma grande exposição a um grupo específico de produtos do agronegócio ou a uma única região do país, o alerta deve ser ainda maior. Por outro lado, se o fundo possui uma composição diversificada, com unidades em diferentes regiões do Brasil, ele tende a ser menos impactado por situações calamitosas, como a ocorrida no Rio Grande do Sul. 

“Nesse caso, embora eventos como perdas de plantações e ativos em gado possam gerar dificuldades econômico-financeiras e afetar os pagamentos e remunerações do fundo, a diversificação reduz a probabilidade de um impacto significativo para o investidor”, explica Gecilda Esteves Silva, professora de Ciências Contábeis do Ibmec Rio de Janeiro.

Segundo a Guide, a exposição dos ativos de Fiagros ao estado do Rio Grande Sul é baixa. A maior parte da exposição dos fundos é para CRAs de empresas das regiões Centro-Oeste e Sudeste. 

“Entre os fundos com maior exposição, podemos citar o Valora Fiagro (VGIA11), que possui diversos CRAs de empresas do Rio Grande do Sul, totalizando ao redor de 40% da carteira do fundo. Outros fundos possuem exposição de 5%, como o Kinea Fiagro (KNCA11) e o Capitania Fiagro (CPTR11)”, afirma a casa de análises. 

Lenon Barbosa, analista da Suno Asset, afirma que o SNAG11 não será atingido diretamente pelos eventos climáticos do RS, pois não tem exposição na região. 

“Ainda é cedo para dizer que vamos ter problemas, que alguns desses fundos terão problemas, mas o investidor precisa ficar atento à composição desses fundos e redobrar a atenção nos que possuem muitos participantes da região sul, ou que esses participantes possuam uma cota bastante expressiva dentro de determinados Fiagros”, conclui Silva, do Ibmec-RJ.

Fiagros: qual a importância do RS para o agronegócio?

A agropecuária será significativamente impactada pelas fortes chuvas no Rio Grande do Sul, que responde por 15% do PIB estadual e 12,6% do PIB agropecuário brasileiro, informa o Santander em relatório.

Produtos como arroz, soja, trigo e carnes são os principais afetados. Cerca de 70% da soja e 80% do arroz já foram colhidos, mas estima-se que metade do restante tenha sido perdida, resultando em uma redução de 800 mil toneladas de arroz e 3,2 milhões de toneladas de soja na produção brasileira, comprometendo 7,5% da produção nacional de arroz e 2,2% da de soja.

O trigo está em fase inicial de plantio, com tempo ainda para se realizar dentro da janela ideal, mas os danos ao solo e perdas de soja podem afetar a intenção de plantio e a produtividade do trigo. “A Conab já previa uma redução na área de trigo, que pode ser ainda maior nas próximas estimativas de safra. Além disso, o estado representou 12% dos abates de suínos e 9,5% dos abates de frangos em 2023, e as enchentes terão um impacto negativo adicional, especialmente para suínos, devido ao ciclo mais longo”, diz o banco.

Com isso, o PIB Agropecuário do Brasil pode recuar 3,5%, acima da estimativa anterior de 3,0%, devido às perdas no setor agrícola e os problemas logísticos que afetam o escoamento da safra e a chegada de insumos, impactando setores como laticínios e carnes.

Nível de seguro para catástrofes climáticas no Brasil é baixo

De acordo com Daniel Castillo, VP de Resseguros do IRB(Re), o nível de proteção no Brasil em produtos de seguro que cobrem impactos de desastres climáticos é muito baixo. Estima-se que menos de 5% da perda econômica esteja segurada no Sul.

“Em geral, o seguro rural inclui proteção a eventos relacionados à chuva. Mas, em relação à produção, cerca de 75% da safra de verão já estava colhida, quando o evento começou. De forma que o impacto na indústria de seguros, nesse sentido, deve ser minimizado. As maiores perdas para o setor como um todo devem se concentrar em auto; habitacional, para alguns setores específicos; patrimonial rural, incluindo silos e máquinas, e empresarial riscos operacionais”, afirma Castilho ao FIIs.

O executivo ressalta que muitos clientes ainda não reportaram sinistros às seguradoras, uma das razões pelas quais não é possível estimar com assertividade os impactos totais causados pelas enchentes no RS.

“Quando o tamanho das perdas econômicas totais estiver evidente, a conversa sobre gap (lacuna) de proteção (diferença entre as perdas econômicas e as perdas seguradas) vai ficar muito aparente, o que ajudará na reflexão da sociedade brasileira com relação à importância de todos estarmos segurados. Seja com seguro de Vida, Rural, Residencial, Patrimonial ou qualquer outro que faça sentido para as pessoas físicas e jurídicas”, diz o executivo, projetando um novo paradigma para a proteção contra enchentes e outras catástrofes naturais após o caso deste ano.

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foto: Vinícius Alves
Vinícius Alves
Jornalista

Jornalista formado na Faculdade Cásper Líbero. Com passagens pela Agência Estado e Editora Globo.

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