FIIs ampliam emissões de cotas: o que o investidor deve fazer?
FIIs buscam ampliar captação de recursos sem aumentar alavancagem: investidor deve olhar preço e também portfólio antes de decisão.
Os fundos imobiliários (FIIs) têm ampliado sua captação de recursos no mercado não apenas com as negociações no mercado secundário, mas também por meio das emissões de cotas, que somaram mais de R$ 7 bilhões nos primeiros dois meses de 2024, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).
O que você vai ler nesta matéria:
- FIIs fazem emissões: como funciona?
- Qual a realidade dos fundos em processo de emissão?
- FIIs com dinheiro em caixa: como será a alocação?
Pedro Dafico, analista de Fundos Imobiliários da Suno Research, avalia que as emissões recentes são fruto de um trabalho eficiente realizado pelos FIIs num momento de mercado desfavorável vivido até o primeiro semestre de 2023, com a Selic em alta na tentativa de conter a inflação.
“São FIIs que realizaram reciclagem do portfólio, incorporando ganhos de capital, crescendo seus dividendos, reduzindo a alavancagem e conseguindo evoluir seu patrimônio de alguma maneira, mesmo num cenário de renda fixa elevada”, afirmou Dafico, creditando esse trabalho a uma gestão ativa com eficiência.
As emissões, além de trazer recursos novos ao mercado de fundos imobiliários, podem se revelar como excelente opção para quem estiver interessado em aumentar seus investimentos no setor – os cotistas atuais, por exemplo, costumam ter direito de preferência nas emissões.
Analistas, no entanto, recomendam cuidado e uma observação atenta antes de decidir pela participação nas emissões. Antes, porém, vamos explicar como é o passo a passo e tentar entender por que os fundos têm optado pela captação via emissão de novas cotas.
FIIs fazem emissões: como funciona?
Quando realiza uma emissão de cotas, o fundo imobiliário opta por captar recursos a partir da expansão de seu universo de potenciais cotistas, já que aumenta o número de cotas em que seu capital se divide. É o mesmo processo de empresas que realizam o chamado follow-on, ou seja, o aumento do número de ações.
Para usar um exemplo concreto de uma emissão recém anunciada: o fundo BPML11 anunciou uma captação projetada de até R$ 780 milhões em sua segunda emissão, com a possibilidade de emitir até 7,7 milhões de cotas, em caso de completar o montante adicional. Considerando que o fundo tem hoje 4.305.079 cotas, existe a possibilidade de ele mais que dobrar de tamanho ao fim da captação.
A captação é feita com um objetivo principal: obter caixa para ampliar as possibilidades de aquisição de novos ativos e, assim, aumentar a rentabilidade do fundo. Para isso, porém, é preciso que o cenário econômico seja favorável – como se mostra atualmente, com a inflação relativamente estável e uma projeção de queda da Selic, hoje na casa de 11,25% ao ano e com tendência a chegar em um dígito até o fim do ano.
No período entre 2021 e 2022, em que o Banco Central elevou a taxa de juros para combater a alta da inflação no pós-pandemia de covid, os FIIs perderam valor de mercado, especialmente no segmento de tijolo, e as emissões se tornaram inviáveis. “Com isso, os FIIs tiveram que optar por um aumento da alavancagem para realizar aquisições, por meio da emissão de CRIs”, explica Carol Borges, analista de Fundos Imobiliários da EQI Research, citando os Certificados de Recebíveis Imobiliários, que são títulos de renda fixa usados por agentes do setor imobiliário para se capitalizar.
Alguns desses fundos hoje estão aproveitando as emissões para, além de aquisições, quitar essas dívidas. “A queda da Selic abriu uma janela para as emissões que estavam representadas, já que os fundos de tijolo recuperaram valor e se mostraram um investimento interessante como alternativa à renda fixa”, aponta Leonardo Nascimento, analista da Urca, gestora de capital, entre eles de alguns FIIs em atuação no mercado, como o URPR11.
Leia também: Fiagros em risco? Analistas sugerem calma após relatos de CRAs inadimplentes
Qual a realidade dos fundos em processo de emissão?
Além do cenário macroeconômico, uma emissão precisa levar em conta a realidade de mercado do fundo imobiliário no momento, e um dos fatores de análise é a relação entre seu valor patrimonial, geralmente usado como referência para a definição do preço das cotas nas captações, e o atual valor de negociação das cotas no mercado secundário, ou seja, no pregão da B3.
Essa relação é chamada de P/VP, e os fundos geralmente realizam sua captação quando ela é igual ou maior que 1, ou seja, quando o fundo vem sendo negociado próximo ou acima de seu patrimônio líquido, que é medido a partir do valor de seus ativos – no caso dos fundos de tijolo, as propriedades reais do fundo.
No mercado atual, segundo dados da Economática ao fim de fevereiro, apenas o segmento de FIIs de shopping, na média, apresentava P/VP de 1. A média do IFIX, o índice dos principais fundos imobiliários, tinha P/VP de 0,89x, em média. O setor de lajes corporativas, que tem maior deságio, tinha média de 0,73x.
“É um setor que precisa de uma adaptação do ponto de vista dos administradores e gestores, já que muitos locatários não voltarão a operar como antes da pandemia, por mais que os índices de ocupação venham melhorando”, analisa Pedro Afonso Gomes, presidente do Conselho Regional de Economia (Corecon) da 2ª região.
Esse cenário afeta as emissões porque, em geral, os fundos realizam as emissões a um preço próximo do valor patrimonial – vamos supor, para um exemplo, de R$ 100. Assim, se o preço de mercado estiver abaixo disso, digamos, em R$ 80, não é vantajoso adquirir uma cota nova por um valor muito maior. Já o contrário pode ser interessante: se o fundo, por diversos fatores, como distribuição de dividendos, começa a negociar com valor mais alto que seu patrimônio, por exemplo R$ 120 em relação a um valor patrimonial por cota de R$ 100, a oferta pode se mostrar vantajosa.
“Entrar em novas emissões a preços em deságio pode ser interessante, caso o recurso seja utilizado para a compra de ativos capazes de trazer ganhos sólidos e consistentes na geração de renda”, alerta Angelo Belitardo, gestor de investimentos da Hike Capital.
FIIs com dinheiro em caixa: como será a alocação?
E é aqui que entra o segundo ponto de alerta dos analistas a respeito do investimento em emissões de cotas: mesmo que o preço esteja vantajoso, é preciso saber o que a gestão do fundo imobiliário projeta fazer com o dinheiro que vai captar, a fim de manter ou ampliar seu patamar de distribuição de dividendos.
Vale lembrar que, mesmo para manter o patamar, o fundo precisa de mais ativos, já que o número de cotas para distribuir o montante também aumenta. Por exemplo: um FII que tem 10 milhões de cotas, para distribuir R$ 1 por mês, precisa alcançar um resultado caixa mensal superior a R$ 10 milhões, já que o patamar de distribuição é de 95% dos ganhos; se ele realiza uma emissão e passa a ter 15 milhões de cotas, esse lucro precisa agora passar por R$ 15 milhões.
Para isso, é preciso adquirir mais ativos. E não quaisquer ativos. “A destinação dos recursos, que entram diretamente no caixa do fundo, deve ser bem planejada, para que os novos ativos possam rentabilizar o dinheiro captado”, avisa Carol Borges, da EQI Research.
E aí não existe fórmula mágica. “É preciso analisar caso a caso, sempre. Entender como o fundo vai administrar os recursos que estão sendo captados, e vemos que não está sendo uma tarefa fácil a boa alocação de recursos no atual cenário do mercado imobiliário”, completa Pedro Afonso Gomes, do Corecon. “O investidor vai precisar enxergar as melhores opções de ampliação dos seus ganhos dada a proposta que está sendo feita.”
Vale lembrar que, em boa parte das ofertas, os FIIs costumam apontar quais serão seus ativos-alvo, ou seja, os investimentos que a gestão planeja realizar com os recursos captados, como novos shoppings, edifícios comerciais ou CRIs, de acordo com o segmento do fundo, inclusive com dados como a projeção de rendimentos com aluguéis e juros.
“Após a aquisição, o investidor deve se atentar para o impacto (positivo ou negativo) no rendimento potencial a ser distribuído pelo fundo. Caso o ativo adquirido pelo fundo seja ineficiente, em termos de geração de caixa operacional, teremos um reflexo negativo no comportamento das cotas”, projeta Angelo Belitardo, da Hike Capital.
Leonardo Nascimento, da Urca, complementa: não faz sentido buscar padrões no mercado de capitais, como sempre entrar numa oferta de cotas ou sempre comprar na baixa. “O deságio é sempre uma boa oportunidade para entrar, mas não deve ser o único fator de tomada de decisão. Conhecer a carteira do fundo, a relação risco-retorno e o histórico das operações é fundamental”, adverte.
E a tendência é que o aquecimento do mercado continue, com a entrada também de FOFs (fundos de fundos, que atuam na compra de cotas de outros FIIs), fundos de tijolo de outros setores e até mesmo fundos de papel, especialmente ao readaptados a ao cenário de inflação e juros menores. Oportunidades não faltarão.
“O investidor no mercado de FIIs deve sempre buscar bons negócios, com um retorno projetado atrativo que leve em conta, claro, os devidos riscos inerentes ao ativo, de forma a trabalhar com uma boa margem de segurança”, conclui Pedro Dafico, da Suno Research.