PAPO COM O GESTOR: Desafio era “educar” o investidor a trocar escritura por cotas de FIIs, diz um dos criadores da gestão ativa

Alexandre Machado, da Hedge Investments, conta como ajudou a criar o primeiro FII discricionário, o HGBS11, em 2006 e os desafios da gestão profissional

PAPO COM O GESTOR: Desafio era “educar” o investidor a trocar escritura por cotas de FIIs, diz um dos criadores da gestão ativa

Há 20 anos, em 2003, ele estava diretamente envolvido na criação do primeiro FIP (Fundo de Investimento em Participações) do segmento residencial. Há 17, em 2006, estava estruturando o primeiro FII (Fundo Imobiliário) com gestão ativa e com cobrança de taxa de taxa de administração sobre o valor de mercado da cota. Alexandre Machado, Managing Partner da Hedge Investments, contou ao fiis.com.br detalhes dessas épocas e as perspectivas para o principal fundo de shopping da gestora – com sua participação na criação – o HGBS11, cuja carteira vem performando bem, apresentando, neste ano, um crescimento de NOI/m2 próximo a 10%, quando comparado ao mesmo período do ano anterior.

Além disso, o fundo captou, na 9ª emissão finalizada no mês passado, R$ 600 milhões, que serão alocados na aquisição de dois novos ativos (60% do Shopping Capim Dourado em Palmas -TO, 43% do Boulevard Bauru Shopping em SP) e no aumento de participação no Shopping Jardim Sul, localizado no bairro do Morumbi em São Paulo. Estas aquisições estão sendo realizadas numa referência CAP Rate em torno de 9%.

Machado lembra também do período da pandemia, como foi difícil, mas de muito aprendizado para os fundos de shopping, sobretudo em relação ao manejo dos custos. Para ele, a proximidade com os lojistas foi um legado que se perpetuou desde aquele momento.

A seguir, os principais trechos da entrevista com o gestor.

  1. Vamos primeiro conhecer um pouco sobre sua trajetória. Desde montar do zero uma divisão de real estate e também ter estruturado o primeiro FII com gestão ativa

Ingressei na Hedging-Griffo em Julho de 2003 quando a empresa, que já era uma grande corretora de valores independente, vinha crescendo bastante nas divisões de Private Banking e Asset Management.

Tínhamos o desafio de estruturar uma plataforma que promovesse a junção dos mercados financeiros e imobiliários numa casa referência em renda variável e de alta performance (a exemplo do Fundo Verde). Desta forma, criamos, ainda em 2003, o primeiro FIP brasileiro, voltado para incorporação residencial. Em 2005, estruturamos o segundo veículo com a mesma estratégia. Ambos funcionaram muito bem e atenderam às expectativas de retorno dos investidores, além de contribuírem para consolidação da área imobiliária na HG. Naquele ano me tornei sócio da HG que possuía a estrutura de Partnership, mesmo modelo adotado hoje pela Hedge Investiments.

Até que, em 2006, logo após a alteração na lei que trouxe o incentivo tributário às pessoas físicas, estruturamos nosso primeiro FII, o Hedge Brasil Shopping (HGBS11). Este produto, a exemplo dos FIPs anteriores, trouxe bastante inovação ao nosso mercado. Foi o primeiro fundo imobiliário discricionário e com gestão ativa, baseada numa política de investimentos. Foi também o primeiro fundo que nasceu sem um ativo previamente identificado e sem vínculo a outros players. O HGBS foi também pioneiro na cobrança da taxa de administração sobre o valor de mercado da cota (estrutura posteriormente adotada como padrão pela CVM para aqueles fundos listados e com mais de 100 cotistas).

O modelo baseava-se na premissa de alinhamento de interesses com seus investidores (à época, era comum alguns FIIs serem estruturados para dar saída, de forma pulverizada, a ativos de grandes players) e o principal desafio era “educar” o investidor a trocar escritura de imóveis por cotas de fundos imobiliários.

Foi um trabalho árduo, especialmente para aquelas gerações que haviam vivido adversidades bruscas na economia, como hiperinflação, confisco de poupança entre outros. O imóvel era visto como o “porto seguro” e os argumentos eram os de que a cota traz a mesma segurança, mas com possibilidade de acesso a mercados mais restritivos (como o de shopping center, por exemplo), liquidez, melhor precificação, gestão profissional, menores custos de transição contando ainda com incentivo fiscal.

  1. Voltando alguns anos, para a pandemia, no caso dos FIIs de shopping, podemos dizer que foi uma fase difícil, mas também de muitos aprendizados, como olhar mais para o controle de custos?

Sem dúvidas, este foi o maior stress test vivido pela indústria de shoppings. Esta indústria (e seus FIIs), sempre carregaram um “prêmio” pela sua resiliência, diversificação de seus contratos e operadores e dinamismo na exploração das mais diversas frentes, como entretenimento, serviços etc. Era impensável uma parada brusca como a que ocorreu. Mais difícil ainda, imaginar vencer a inércia da retomada posterior. Ocorre que, mesmo com os shoppings fechados, muitas das despesas permaneciam, tais como, IPTU, segurança, manutenção de equipamentos, energia (muitas vezes já contratadas no mercado livre), seguros etc. E, num cenário em que os lojistas tiveram suas finanças fortemente afetadas.

Esta experiência proporcionou dois legados principais, em minha opinião. O primeiro, decorrente das reduções necessárias nas despesas de condomínio. Algumas soluções foram desenvolvidas e se perpetuaram no pós-pandemia.

Outro legado, que se mostrou estrategicamente fundamental, foi a proximidade e flexibilidade para com os lojistas. Os shoppings tiveram o desafio de entender e tentar acomodar o sofrimento vivido pelos lojistas naquele momento, concedendo descontos, acomodando o fluxo dos boletos entre outros, evitando assim a descontinuidade de determinadas operações. De fato, isto evitou uma escalada na vacância e foi fundamental para que a indústria tivesse “pronta” para a retomada. Os fortes indicadores de resultado na volta à regularidade demostram a assertividade desta estratégia.

  1. Vemos de pouco tempo para cá, um maior entusiasmo para com o mercado de FIIs, alguns chegando até quase 1 milhão de cotistas, como o de papel MXRF11. Isso sobretudo com quedas da Selic mais recorrente. No que isso impacta nos fundos de tijolo de shoppings? Há perspectiva de entrada de mais investidores?

Sim, a queda da Selic é fundamental para o desenvolvimento dos FIIs que, embora tenha se desenvolvido substancialmente nos últimos anos, alcançando um volume de R$ 210 bi em PL para os fundos listados, em cerca de 2,3 milhões de investidores, ainda possui muito espaço para crescer. A indústria de FIIs representa menos de 3% da indústria de fundos no Brasil. Em economias mais maduras, é comum observarmos uma participação em torno de 15%.

Portanto, na medida em que se difunde o conhecimento desta indústria a tendência é que ela cresça substancialmente. Além da queda de juros, a tributação dos fundos exclusivos, pode incentivar a demanda e ser forte indutor de crescimento e consolidação dos FIIs num futuro próximo.

  1. Vemos uma leve alta da vacância, o que pode estar ocorrendo?

O varejo vem percebendo, ao longo deste ano, um movimento de acomodação. A crise de algumas varejistas, tais como LASA, Marisa, TokStok e, mais recentemente, Starbucks, ocasionou a redução ou fechamento de lojas, provocando aumento de vacância. Este movimento, apesar de aumentar a vacância pontualmente, muitas vezes traz oportunidades aos shoppings, especialmente para os mais maduros e com altas taxas de ocupação, já que permitem o ingresso de operações mais alinhadas às tendências atuais e que vêm ganhando espaço no pós-pandemia, tais como operações de gastronomia, serviços e entretenimento.

Estes movimentos são comuns numa indústria tão dinâmica como as de shopping. O grande desafio é sempre promover maior atratividade aos ativos e oferecer uma jornada agradável, segura e conveniente aos clientes.

  1. No que o cenário externo – como juros mais altos nos EUA – impactam no mercado nacional de FIIs, e nos de shopping?

A exemplo de outros produtos financeiras, estamos inseridos dentro do contexto macro onde as perspectivas econômicas são de fundamental importância. Os juros nos EUA influem nos preços dos ativos, fluxo de capital e suas consequências, tais impactos na inflação e taxa de juros domésticas, além do comportamento no mercado de trabalho, capacidade de consumo, nível de endividamento das empresas e pessoas, estabilidade etc.

Estes indicadores, por sua vez, influem diretamente em decisões que vão, desde a implantação de uma nova operação no shopping, até a de compra de produtos e serviços, fundamentais para a adequada performance das operações de um shopping.

  1. E o cenário doméstico, quais eventos pode destacar que são pontos de atenção da gestão?

Numa visão macro, além do comportamento dos juros, o comportamento de consumo das pessoas e a percepção de estabilidade econômica, por sua vez ligada ao equilíbrio fiscal e da inflação do país. Já no micro, é muito importante identificar tendências e ajustar o tennant mix dos shoppings a estes movimentos.

  1. Vamos falar o HGBS11, da última emissão e do fato de o portfólio, com o NOI/m2, crescendo em agosto, comparando com o ano passado. Quais as perspectivas?

Estamos num momento bastante favorável e promissor para o HGBS. De fato, a carteira vem performando bem, apresentando, neste ano, um crescimento de NOI/m2 próximo a 10% quando comparado ao mesmo período do ano anterior. Adicionalmente, finalizamos a 9ª emissão do fundo, onde foram captados pouco mais de R$ 600 milhões. Estes recursos serão alocados na aquisição de dois novos ativos (60% do Shopping Capim Dourado em Palmas -TO, 43% do Boulevard Bauru Shopping em SP) e no aumento de participação no Shopping Jardim Sul, localizado no bairro do Morumbi em São Paulo. Estas aquisições estão sendo realizadas numa referência CAP Rate em torno de 9%, referência bastante saudável ao fundo.

  1. E os demais fundos de shoppings da Hedge, o que destacaria?

Além do HGBS, temos 5 outros fundos de shopping geridos e administrados pela Hedge, são eles o FIGS11, FLRP11, WPLZ11, HPDP11 e ATSA11. Cada qual, destaca-se em determinados pontos. O FIGS (+19%) e o FLRP (37%) vem apresentando significativo crescimento de rendimentos (x 2022) e consequente valorização das cotas em bolsa. O WPLZ e o HPDP estão passando por importante processo de revitalização e o ATSA, após impacto causado pela pandemia, vem apresentando forte redução de vacância nos últimos meses.

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foto: Juliana Colombo
Juliana Colombo
Editora

Editora do site FIIs.com.br, é jornalista de economia há 15 anos. Atuou nas maiores redações do país, como TV Globo, CNN, Valor Econômico, Folha de S. Paulo. Já ganhou o Prêmio Folha de Jornalismo e também os da Abecip e do Itaú-IBGC. Foi gestora de núcleo editorial em agência de comunicação empresarial, editora-chefe de revista de negócios e gerente de conteúdo na CNN Brasil, do site CNN Brasil Business.

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